Adalcinda Camarão – “Dos campos tranquilos do meu Marajó à Belém, minha terra, meu rio, meu chão”

Bom Dia Belém!

Há muito que aqui no meu peito
Murmuram saudades azuis do teu céu
Respingos de orvalho me acordam
Luando telhados que a chuva cantou
O que é que tens feito, que estás tão faceira
Mais jovem que os jovens irmãos que deixei
Mais sábia que toda a ciência da terra
Mais terra, mais dona, do amor que te dei
Onde anda meu povo, meu rio, meu peixe
Meu sol, minha rede, meu tamba-tajá
A sesta, o sossego na tarde descalça
O sono suado do amor que se dá
E o orvalho invisível da flor se espalhando
Cantando cantigas e o vento soprando
Um novo dia vai enunciando, mandando e
Cantando cantigas de lá

Me abraça apertado que eu vou chegando
Sem sol e sem lua, sem rio e sem mar
Coberta de neve
Levada no pranto dos rios que correm
Cantigas no ar
Onde anda meu barco de vela azulada
De foi depenada sumindo sem dó
Onde anda a saudade da infância na grama
Dos campos tranquilos do meu Marajó
Belém, minha terra, meu rio, meu chão
Meu sol de janeiro a janeiro, a suar
Me beija, me abraça que eu
Quero matar a imensa saudade
Que quer me acabar
Sem círio de virgem, sem cheiro cheiroso
Sem a chuva das duas que não pode faltar
Murmuro saudades de noite abanando
Teu leque de estrelas
Belém do Pará!


Para quem não conhece ou nunca ouviu falar em Adalcinda Camarão, foi ela que compôs a letra da música “Bom Dia Belém”! Um clássico da música paraense e um hino de amor à Belém imortalizado na voz da Fafá de Belém.  Essa composição Adalcinda fez quando morava em Washington entre os anos de 1956 e 1960 período em que viajou para os EUA para estudar através de bolsa de estudo viabilizada pela Embaixada Americana no Brasil da qual era funcionária. Ela também foi casada com Líbero Luxardo e teve um filho dessa relação.

No artigo intitulado ASPECTOS CRÍTICOS-SOCIAIS NA POÉTICA DE ADALCINDA CAMARÃO.
construído por Ariane Baldez Costa e Iris de Fátima Lima Barbosa a ser publicado na Revista PZZ

O universo literário da autora Adalcinda Camarão é vasto, sendo que seus temas freqüentemente são circundados de lirismos, encantos, sentimentos e muito subjetivismo.
         Embora essas características reflitam elementos suaves, a poetisa não se limitou somente aos versos que refletiam a sua vida pessoal, como também cultivou em sua poética elementos que trazem à tona questões sociais, questões traduzidas em protestos, denúncias, injustiças muitas vezes veladas pela sociedade e que ela enfatiza criticamente em seus versos. Como ela mesma afirmou, “sincera, espontânea e natural, a poesia contemporânea é a que oferece melhor oportunidade ao poeta para comentar, exaltar ou lamentar, que seja o momento exato que a vida nos poupa, sem enfeites convencionados” 
          Buscando através das discussões estabelecidas em seus poemas, Adalcinda descreve a sociedade de forma hipócrita e egoísta, onde o individualismo é o sentimento mais cultivado e a exclusão social cada vez mais ressaltada, sendo que tal fator é tido muita das vezes de fato como uma tradição muito antiga e que se perdura até os dias atuais.

          Adalcinda Magno Camarão Luxardo foi poetisa e compositora brasileira que nasceu em Muaná na Ilha de Marajó em 18 de julho de 1914  e faleceu em Belém no dia  17 de janeiro de 2005.
Estudou em Belém no colégio D. Pedro II e no Instituto de Educação e nessa cidade desenvolveu todo o seu trabalho cultural. É autora de vários livros de versos como: “Baladas de Monte Alegre”, “Entre Espelho e Estrelas”, “Folhas”, “Vidências”, escreveu para rádio, teatro e jornais e revistas da Amazônia desde os dez anos de idade.
No ano de 1938, Cléo Bernardo e um grupo de colegas de faculdade de Direito, fundaram Terra Imatura, revista mensal de estudantes, cujo título foram buscar em um romance regionalista de Alfredo Ladislau. Terra Imatura ganhou importância nas letras paraenses, onde despontavam Adalcinda e sua irmã Celeste Camarão, Dulcineia Paraense, Mirian Morais, Paulo Plínio Abreu, Ruy Barata e outros mais, na poesia, alguns formando a redação da revista.
          Em 1956, Adalcinda viajou para os EUA, com Bolsa de Estudo oferecida pelo Departamento de Estado, com o Departamento de Educação e recomendada pela Embaixada Americana no Brasil. Fez mestrado em Educação e lingüística (American Univerity e Catholic University, EUA, de 1956 a 1959).
Recebida como membro efetiva e perpétua da Academia Paraense de Letras em janeiro de 1959, ocupou a cadeira nº 17 e teve como patrono Felipe Patroni. 



Casou-se com o cineasta Líbero Luxardo, também da Academia Paraense de Letras, com quem teve um filho. Fixou residência nos Estados Unidos, em Washington, sem esquecer a sua academia, mandando de quando em vez, seus belos poemas para a revista.
A poetisa dos Anos Trinta, aquela que escrevia em Terra Imatura, muito jovem ainda, continuou florescendo e encantando a todos. Na Terra Imatura, número de março de 1939, encontramos o Poema “Bujarronas do Guamá”.



Adalcinda, muito embora ausente, nunca pensou em abandonar ou deixar a sua Academia. Seus versos mais recentes, cada vez mais untados de amor, são mandados para divulgação. Na revista, volumes xxviii, de 1987, podem encontrar “três poemas”, um dedicado ao filho: “Trinta de Abril”.
Voltando à Terra Imatura do saudoso Cléo Bernardo, lê-se muitas outras produções de Adalcinda, produzidas nos anos trinta, quando já era selecionada entre “os poetas modernos da Amazônia”, ao lado de Bruno, do Dalcídio, do Nunes Pereira, do Ruy Barata, todos pondo o maior vigor e vida à corrente modernista da poesia, desencadeada em 1922, em São Paulo e que alcançava as margens do Rio-Mar. No número 13, referente a dezembro de 1940, a revista agrupou vários poetas, transcrevendo, de cada um, magníficos versos da escola moderna. Adalcinda lá está. Aparece com “Explicação Inútil”.
A revista Terra Imatura, naqueles anos distantes, teve grande papel no aprimoramento cultural dos jovens, ela e outras mais, como o Pará Ilustrado, de Edgar Proença, A Semana, do Ernestino Sousa Filho, Brasileis, de Silvio Meira, com a característica de serem mensais, a A Semana a única semanal. Hermógenes Barra, na Revista da Veterinária, também prestou relevante serviço as letras do Pará, não somente através da revista, como principalmente, pela tipografia que possuía e que acolhia a todos.
Publicou, durante muitos anos, todas as teses de concurso de cátedra ou docência, livros de Antônio Tavernard, Augusto Meira, Bruno de Menezes e tantos outros.

Adalcinda Camarão, ou simplesmente Adalcinda, é desse tempo, uma das grandes animadoras da PRC-5, a rádio de Edgar Proença, Lorival Penálber e Eriberto Pio. “A voz que fala e canta para a planície”.
Adalcinda sintetiza uma época, merecendo ser lembrada, ou relembrada, distante que está na terra de Tio Sam. Mas, Adalcinda não parou, sua pena e sua lira continuaram a emitir belos sons em terra distante, não esquecendo jamais o torrão natal, de que são prova os belos versos, mandados de Washington, D.C.,Divulgados pela A Província de 7 de março de 1989, extraído do livro Folhas: “Voz”. De 1956 a 58, trabalhou em conferência e entrevistas para a Voice of América, em Washington, D.C., onde permaneceu radicada.

De 1957 a 60, ensinou Português para estrangeiros, na La Case Academy of Languages e Sanz School. Em 1960, abriu o Departamento de Português da Georgetown University (Institute of Languages and Linguístics), onde também ensinou Literatura do Brasil e de Portugal, de 1960 a 1965.
Lecionou Português na American University em 1974 e 1975; na Graduate School of the Agriculture Department, de 1966 a 1977; na Casa Branca, para assistentes dos presidentes Nixon e Gerald Ford, em 1974 e 1975; na Arlington Adult Education, 1986, 1987 e 1988. Trabalhou na Embaixada do Brasil, em Washington, D.C., de 1961 a 1988.
Em 2000, retornou para Belém, depois de 44 anos morando nos Estados Unidos e no dia 17 de janeiro de 2005, às 17h, morre por complicações em decorrência pela idade avançada. Aos 91 anos, Adalcinda faleceu em casa.

Livros:
Despetalei a Rosa. Poesia, 1941;
Vidência. Poesia, 1943;
Baladas de Monte Alegre. Poesia, 1949;
Entre Espelhos e Estrelas. Poesia, 1953 (Premiado como o melhor livro do ano pelo Governo do Estado);
Caminho do Vento. Poesia, 1968;
Folhas. Poesia, 1979;
A Sombra das Cerejeiras. Poesia, 1989; e
Antologia Poética. Poesia, Belém, CEJUP, 1995.
Teatro
Um Reflexo de Aço, 1955; e
O Mar e a Praia, 1956)
Folclore
Lendas da Terra Verde, 1956
Educação
Brasil Fala Português. Livro Escolar, 1964 e
Comentários no Espaço e no Ar (At the Red Lights, em inglês, 1977).

É detentora de inúmeras medalhas condecorativas e diplomas. Dos EUA, colaborou com os jornais paraenses. A Província do Pará, O Estado do Pará e O Liberal.

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